O que me inspirou a escrever sobre esse tema foram alguns artigos recentes descrevendo entrevistas com familiares de autistas sob tratamento com canabinóides. Este ano tem saído bastante informação sobre o tema e eu tenho ouvido experiências positivas de várias pessoas aqui no Brasil. Inclusive, recebi para revisar um artigo com uma série de casos clínicos brasileiros, que deve ser publicado em breve, com participação do pesquisador brasileiro Dr. Renato Malcher Lopes, que foi a primeira pessoa de quem ouviu falar que os canabinóides poderiam ser úteis para o autismo. Ele tem interesse pessoal no assunto por conta de seu filho. Como ele mesmo diz: “Isso não é conflito de interesse, é sinergia de interesses”. Faz sentido.
A opinião do pesquisador da UNB é compartilhada por outros profissionais internacionais, como por exemplo, essa neurologista israelense, que já tratou diversos casos, e acredita que o canabidiol (CBD) é particularmente útil no manejo dos sintomas comportamentais dos autistas. Honestamente, tenho pouca vivência com o tema “autismo”, e bastante inquietação sobre, o que, e como, isso pode funcionar. Portanto, resolvi estudar o tema e compartilho com vocês o que descobri de mais interessante.
O primeiro artigo relata uma grande pesquisa nacional feita com estudantes para entender que efeitos são obtidos pelos que usam. E se usam, supostamente experienciam benefícios. Ou seja, estamos perguntando diretamente para aqueles que gostam e apoiam o uso.
Essa pesquisa usou uma escala de “eficácia” de 5 níveis, indo de 0 (sem benefício) até 4 (grande benefício). O score geral alcançado pelo tratamento foi de 2,8 o que é equivalente à interpretação de que há algum benefício de intensidade moderada a boa. A tabela abaixo menciona os principais benefícios obtidos: redução da ansiedade/ irritabilidade/ agitação, melhoras cognitivas, no sono e interação social.
Uma parcela considerável (1 em 5) também relata uma melhora generalizada, ou seja, “sente-se bem” com o tratamento.
Para avaliar os efeitos adversos, foi utilizada uma escala de 4 níveis, indo de 0 (sem efeito adverso) até 3 (efeito adverso grave). Na média, o score foi baixo (0,4) e a maioria dos efeitos adversos foram associados a tratamentos contendo THC em sua composição. Os efeitos mais comumente observados foram boca seca, dificuldade cognitiva, fadiga/cansaço, tontura, agitação, problemas comportamentais e outros. A ocorrência e gravidade de efeitos adversos foi sensivelmente menor nos pacientes tratados com CBD ou composição contendo CBD/THC combinados.
Um outro estudo, chamando atenção para a experiência “de vida real” no tratamento de autistas com cannabis medicinal em Israel, parece confirmar que essa idéia de que autismo se trata com canabidiol (CBD). Essa pesquisa retrospectiva, semelhante ao anterior, mostra que o tratamento com canabidiol (CBD) melhorou problemas comportamentais, de comunicação, ansiedade e estresse em uma parcela bastante significante dos indivíduos entrevistados. Pelo menos 1 em cada 3 indivíduos manifestaram esse tipo de beneficio. Curiosamente, os próprios autores mencionam que se inspiram no que observaram com pacientes epilépticos sendo tratadas desta maneira. E realmente, os efeitos relatados parecem muito semelhantes.
No final das contas, aos meus olhos, o efeito do canabidiol (CBD) nas diferentes formas de autismo se resume em algo bem conhecido para esta molécula: redução de ansiedade e melhora comportamental. Vale a pena tentar.
Abaixo a tabela relatando os dados do estudo, com acompanhamento de 6 meses. A melhora em aspectos comportamentais é bastante evidente.
Além dos sintomas específicos, um relato bastante comum no tratamento com canabidiol (CBD) é a melhora na “qualidade de vida” do paciente. Como isso se manifesta para um paciente autista?
No estudo mencionado acima, 1 em cada 3 relataram melhora na qualidade de vida que se expressa como melhora de humor, autonomia (ex: habilidade para se vestir ou tomar banho sozinho), melhora na concentração e qualidade do sono. Os efeitos adversos foram relatados por 1 em cada 4 pacientes, mas foram sempre brandos, e particularmente relatam a segurança do tratamento frente aos potenciais dos benefícios observados (vide acima).
Em um terceiro estudo, também de Israel, foi relatado que o “óleo de canabidiol” melhorou sintomas comportamentais, reduziu os ataques de ira, reduziu a chance do paciente provocar machucados em si mesmo, reduziu hiperatividade e melhorou sintomas de ansiedade e qualidade do sono. O número é bastante robusto, visto que 75% dos pacientes relatam melhoras desta natureza. Novamente, os eventos adversos mais frequentes são ligados à sonolência, fadiga e mudanças de apetite, que aparentemente são ínfimos frente aos potenciais benefícios observados.
No final das contas, aos meus olhos, o efeito do canabidiol (CBD) nas diferentes formas de autismo se resume em algo bem conhecido para esta molécula: redução de ansiedade e melhora comportamental. Dada a comorbidade entre autismo e epilepsia, ou maior ocorrência de convulsões em autistas, não é de se surpreender que a molécula que reduz convulsões mesmo em pacientes refratários a tratamentos convencionais também ajuda a melhorar o quadro de autismo. Há uma forte linha de pesquisa sugerindo que o autismo é uma manifestação do mesmo fenômeno cerebral que gera a epilepsia, e portanto, quem sabe o efeito do canabidiol em ambas as patologias seja semelhante. Eu não tenho certeza quanto ao efeito, ou mecanismo associado, mas pela simples análise de custo-benefício destes artigos parece ser um tratamento legítimo e que vale a pena considerar.
Já há um estudo israelense registrado em repositório oficial de estudos clínicos testando a eficácia e segurança do tratamento de uma composição 20:1 de CBD:THC para o autismo. O estudo é realizado no maior rigor de estudos clínicos (randomizado, duplo-cego, controlado por placebo) com 150 pacientes voluntários. Resultados aguardados ansiosamente e devem ser publicados em breve!
Fonte: Site Medium