Defendidos por integrantes do governo Jair Bolsonaro como uma alternativa ao cultivo da cannabis para fins medicinais, os medicamentos à base de cannabis sintética não tem autorização de pesquisa e comercialização no País, segundo a própria Anvisa.
Entre os defensores da cannabis sintética no governo estão os ministros da Cidadania, Osmar Terra, e da Casa Civil, Onyx Lorenzoni. Eles argumentaram que o produto sintético eliminaria a necessidade de haver o cultivo da planta em território brasileiro. A liberação do plantio no País está em discussão na Anvisa, que concluiu no último dia 19 uma consulta pública sobre o assunto.
Terra que chegou a defender o fechamento da Anvisa caso o plantio seja liberado, tem sido chamado nos corredores da Anvisa de “garoto propaganda da cannabis sintética”. O ministro se reuniu no mês passado com Eder Fernando Mafissoni, diretor da empresa Prati-Donaduzzi, que se apresenta como pioneira na área de produtos sintéticos a base de cannabis no Brasil. Na Anvisa, porém, a informação é de que a companhia não tem autorização para comercializar nem para fazer pesquisas sobre esse tipo de produto no País.
“Como medicamento, qualquer produto deve seguir as regras do registro de medicamentos. Isso se aplica também ao canabidiol sintético que, para estar disponível no mercado farmacêutico, precisa cumprir as exigências já existentes para medicamentos em geral”, afirma a Anvisa em nota.
No dia 12 de julho, um dia após receber o diretor da Prati-Donaduzzi, Osmar Terra foi a uma de suas redes sociais defender que não é preciso plantar cannabis no País para que se consiga medicamentos para os pacientes que dependem do canabidiol. “Não precisa plantar cannabis no País para ter a única das 480 moléculas do cigarro da cannabis que não causa dano ao cérebro e ao organismo. A Anvisa está arrumando desculpa para o plantio e a legalização da droga”, escreveu.
Terra publicou a mensagem acompanhado de um tuíte que compartilha de um dos técnicos do ministério. Nele, “gabardojoão” diz que o Brasil deverá ser o primeiro País do mundo a produzir sinteticamente a molécula do canabidiol. “A plantação de cannabis torna-se totalmente desnecessária para fins medicinais.”
O Estado solicitou à Anvisa, que é quem controla a venda de medicamentos no País, quais são, atualmente, as empresas autorizadas a fazer pesquisas na área de cannabis sintética no Brasil. A agência informou que não há, no momento, qualquer autorização no país para venda ou pesquisa nesta área.
Na área de pesquisa clínica, feita com seres humanos para o desenvolvimento de um medicamento, há uma pesquisa autorizada pela Anvisa com canabidiol. Mas essa pesquisa é para cannabis fitoterápica, não a sintética. A empresa que recebeu o aval foi justamente a Prati-Donaduzzi, que tem como parceria na empreitada a Universidade de São Paulo (USP).
Questionada sobre o que, para a agência, significa a classificação “fitoterápico”, a Anvisa disse que “é um produto obtido com emprego exclusivo de matérias-primas ativas vegetais”.
Ou seja, a única cannabis pesquisada, no momento, no Brasil, dependeria do cultivo, que vai contra a ideia defendida pelo governo.
“A pesquisa clínica é uma fase anterior ao pedido de registro de medicamento, portanto estamos falando de estudos que ainda estão sendo conduzidos”, ressalta a Anvisa.
Um dos textos em consulta pública, que trata da liberação da cannabis medicinal no País, se dedica ao estabelecimento de regras para que empresas possam cultivar a planta cannabis para que seja utilizada exclusivamente como insumo de medicamentos registrados previamente na Anvisa. Ou seja, a produção é limitada e exclusiva para que fabricantes possam produzir medicamentos. “Em outras palavras, os produtos acabados com base em cannabis spp. serão analisados e avaliados pela Agência na categoria fitoterápicos”.
Questionada se a empresa Prati-Donaduzzi tem autorização para vender remédio a partir de canabidiol sintético no Brasil, a Anvisa disse que, atualmente o medicamento Mevatyl, da empresa Beafour Ipsen Farmacêutica LTDA, é o único que possui registro e que pode, portanto, ser comercializado.
Fonte: Estadão